O Festival Folclórico de Parintins, celebrado no fim de junho, serviu de palco para mais do que alegorias deslumbrantes e toadas vibrantes. Foi também o epicentro de uma polêmica que reverberou nas arquibancadas, nos bastidores e nas redes sociais.
O Boi Garantido ergueu o troféu de campeão com o tema “Boi do Povo, Boi do Povão”. Mas a grande narrativa desta edição ficou por conta das contestações. O presidente do Caprichoso, Rossy Amoedo, abandonou a apuração após discordar das notas atribuídas ao seu levantador de toadas, que recebeu 9,8 e 9,9, enquanto o rival obteve dois 10. Rossy classificou as notas como “ridículas” e acusou a comissão de favorecer o Garantido.
A partir daí, o que era para ser uma comemoração virou desconfiança. O Caprichoso anunciou que pediria a anulação do resultado, questionando a atuação de jurados como Hylnara Anny, que deu notas baixas ao azul e notas máximas ao vermelho. O Garantido também pediu mudanças em três jurados, mas a organização do evento manteve os nomes já definidos. Um abaixo-assinado pedindo investigação e nova apuração circulou nas redes, somando milhares de assinaturas.
No meio dessa análise, é importante lembrar que essa polêmica envolvendo jurados é algo muito antigo. Mas também pode ser real, como não pode. Às vezes nosso quintal está com a grama aparada, mas o do vizinho tal qual está com a grama um pouco mais verde. No entanto, Parintins precisa cortar essa sangria rapidamente, sob pena de em um curto espaço de tempo declinar. É preciso mudanças drásticas no corpo de jurados. Não faz sentido algum um mesmo jurado julgar ambos os bois por três noites seguidas. Isso não é um desfile de carnaval no qual o julgamento é único para várias escolas que passam um só dia na frente dos julgadores.
Parintins sempre foi exemplo na produção magnífica de alegorias, mérito indiscutível dos artistas da ilha, mas precisa se reinventar. Os diretores dos bumbás precisam sentar ao redor de uma mesa e repensar não só a forma de julgamento, mas torná-la transparente. É importante lembrar que quem banca os milhões de reais investidos pela União, Estado e Município na festa é o torcedor. Mesmo nas arquibancadas gratuitas, todo mundo paga caro pra estar na ilha. Não existe almoço grátis em Parintins. Nem lanche. Tudo é pago. O contribuinte merece mais respeito, de ambos os bois.
Não dá para um bumbá apresentar uma alegoria ruim e dizer que isso é folclore. Não é. E eles sabem disso. Quem está dentro dos bois sabe os motivos da disparidade. Mas também não dá para entrar na arena com alegorias grandiosas e lindas e não cuidar dos itens ou da organização de arena. Todo espetáculo tem falhas. Todos somos humanos. Temos e teremos falhas por toda a vida, mas isso não significa que não possamos melhorar.
Escrevo essa reflexão porque, mesmo sendo torcedor do Caprichoso, e isso nunca foi segredo para ninguém, não dá para dizer que houve compra de jurados e afirmar que apenas isso tirou o mérito do Garantido. O Caprichoso sempre foi indiscutivelmente gigante na arena, mas é preciso afinar algo. Durante três anos o título foi azul, com mérito. Não há motivos para diminuir ou causar indisposição ao Garantido. Os torcedores de ambos os bois não merecem isso. O festival não merece isso. Os dirigentes precisam parar, refletir e acabar com essa visão míope. É preciso retornar às raízes, fazer folclore, ser rival somente na arena. É tempo de retomar a essência da festa e garantir a diversão do boi, a diversão do povo. Baixem a soberba e reinventem essa festa, enquanto há tempo. Brinquem de boi e partam para a chegada da 60ª edição, em 2027, com mais leveza e rivalidade saudável.
Com base em tudo isso, arrisco dizer que além dos tripas, os grandes vencedores dessa festa foram os amos dos bois Caprichoso e Garantido. Caetano Medeiros e João Paulo Faria protagonizaram uma batalha ansiosa na arena. Uma batalha que cria expectativa entre os torcedores. Isso é bom e deve continuar, mas com responsabilidade. Garantido venceu e o fluxo do rio Amazonas e da vida segue. E ponto.
Então, meus amigos, este jornalista aqui conclui que os campeões da festa foram os torcedores apaixonados pelos seus bois e os amos dos bumbás, que aos poucos retomam a tradição. Em 2026, se a vida e o Criador permitirem, estarei em Parintins e tenho certeza que poderei ver um folclore verdadeiro. Daqueles que nos encantam. Aquele da década de 90, quando minha mãe me apresentou o boi. Aquele do início dos anos 2000, que lotava festas, conquistava rádios e tocava o sentimento dos torcedores.
Olha… deu até vontade de escrever uma toada. Quem sabe?
Até a próxima!
Mário Marinho
@mariomarinho